Colóquio do MCCE discute eleições com dezenas de entidades
Brasília – O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral – MCCE realizou nesta terça-feira (7), na sede do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil-OAB, o Colóquio MCCE: Eleições 2016 – O desafio das eleições baratas e transparentes.
Pela primeira vez as eleições brasileiras terão a proibição do financiamento de campanhas por empresas. Esta foi a decisão do Supremo Tribunal Federal – STF que declarou inconstitucional a doação de empresas às campanhas políticas (ADI 4650). Neste sentido, e com as mudanças vindas com a reforma eleitoral do Congresso em 2015, o Colóquio veio reforçar o comprometimento do MCCE com a lisura nas eleições.
O presidente da OAB, Claudio Lamachia abriu o evento dizendo sobre importância de se buscar campanhas mais baratas, transparentes e “acima de tudo, limpas”. Para ele a OAB está absolutamente comprometida com o tema e com o combate ao caixa dois de campanha. Lamachia disse que a situação que o país vive hoje é consequência de um voto mal feito. “Devemos buscar saber quem é a pessoa em quem vamos votar”, afirmou o presidente.
Moderando a mesa, o diretor do MCCE, Luciano Santos, lembrou do protagonismo do MCCE que mobilizou a sociedade brasileira na conquista da lei 9840/99 e LC 135/10, respectivamente conhecidas como “Lei contra a compra de votos” e “Lei da Ficha Limpa”, as duas únicas lei de iniciativa popular anticorrupção do país. Afirmou que a participação direta da população é muito importante na promoção das mudanças sociais e que “o desafio destas eleições é justamente combater o caixa dois”. Disse ainda que em todos os estados, comitês de combate a esta prática estão sendo criados.
Craig Holman, americano, especialista em reforma do financiamento de campanhas eleitorais, ética nos governos, prática de lobby e impacto do dinheiro, da ONG Public Citizen, iniciou a sua fala afirmando que o aspecto mais importante que tem observado na política brasileira é esta ação contra o financiamento de campanhas por empresas.
Ele enfatizou o significado desta ação brasileira explicando um pouco da história dos Estados Unidos no que diz respeito ao financiamento de campanhas.
Holman disse que os Estados Unidos tinham um bom sistema eleitoral que levou cerca de 100 anos para ser construído. Sistema que regulava o dinheiro na política garantindo a transparência. Enfatizou que no século retrasado, nos Estados Unidos, as empresas gastavam livremente nas campanhas eleitorais quando industriais compravam senadores, época em que se tinha “senador dono da Chevron, deputado dono da Boing”, fazendo uma analogia com empresas atuais. Tempo em que a influência coorporativa nas eleições se tornou tão corrosiva que era preciso ter fim. Foi quando uma lei (Tilman) baniu as contribuições empresariais das eleições federais e aperfeiçoou o sistema de financiamento de campanhas ao longo das décadas.
Na década de 70 quando do escândalo de Nixon e Watergate, se provou que Nixon recebia dinheiro de caixa dois, de gente muito rica e de muitas empresas, foi aprovada uma lei que impôs limites às contribuições de todas as fontes. Não eram permitidas doações a candidatos que superassem mil dólares por eleição. Assim, foram banidas as contribuições empresariais e estipulado o limite de doação para pessoa física.
Em 2002, por não terem um bom sistema de transparência, os americanos aprovaram uma lei que redefiniu a propaganda de campanha para captar doadores de grupos externos que pretendiam influenciar as eleições. Com esta lei, segundo Holman, se conseguiu quase 100% de publicidade das doações, porque se sabia exatamente de onde vinha o dinheiro tendo sido também impostos limites às contribuições empresariais. Assim, se tinha o limite das contribuições a candidatos e partidos políticos e a proibição do financiamento coorporativo.
Surgiu a suprema corte criada pelo presidente George Bush, “uma corte não progressista que normalmente se dobrava ao Congresso e à esfera política quando se tratava de questões relacionadas ao financiamento de campanhas”, disse Craig. Quando o presidente Bush nomeou novos ministros para a suprema corte que eram corporativistas e muito conservadores. Com isso, a nova corte em janeiro de 2010, a “Corte do Bush”, determinou no caso “Citizens United vs FEC” em que empresas são pessoas e que por isso, passavam a ter o direito constitucional de gastar quantias ilimitadas nas eleições, o que nos jogou para trás dezenas de anos.
Em 2012, o dinheiro das campanhas veio de apenas 0,25% dos americanos, onde 99,75% da população não está participando do financiamento das eleições. Para piorar o quadro, a maior parte destes financiadores de campanha são homens, brancos e ricos.
O impacto imediato foi que os gastos nas eleições aumentaram dramaticamente desde esta decisão. Segundo dados apresentados pelo Sr. Holman, em 2012 foram gastos 7 bilhões de dólares para se eleger o congresso e o presidente dos Estados Unidos. Para ele, em 2016, é esperado um gasto de 10 bilhões de dólares para eleger o congresso e o presidente.
Outra parte importante a se destacar são as doações de grupos externos, que nem sempre se sabe quem são. Os gastos externos destes grupos/corporações se quadruplicaram nas eleições de 2010, primeiro ano após a decisão da suprema corte (Gastos externos em milhões de dólares/ano eleição: 338,3/2008 e 1.036,6/2012). Para Holman, trata-se de dinheiro gasto nas eleições que não se sabe de onde veio. “Pode ter vindo da máfia, de organizações criminosas, de qualquer parte”, afirmou e completou: “Tanto dinheiro gasto em campanhas terá consequências inacreditáveis”.
Com esta manipulação do financiamento de campanhas, Holman diz que a população americana está irritada por não saber de onde vem o dinheiro que elege seus representantes. Para ele, “é preciso corrigir toda essa distorção que teremos nas eleições de 2016”.
Craig Holman disse ainda que admira muito o trabalho desenvolvido pelo MCCE e pela OAB.
Marlon Reis cofundador do MCCE, também atuando como conferencista, ressaltou que hoje há um debate global sobre a democracia, que “a democracia é uma ideia em construção” e que o financiamento de campanhas é um “problema global” havendo um debate muito forte na Europa, em países como a Espanha e Alemanha, como também pelo pré-candidato à presidência dos Estados Unidos Bernie Sanders
Para Reis, com eleições financiadas por empresas ficam os questionamentos “quem paga?”, “quem é representado?”. Desta forma, ninguém se sente representado e o Congresso Nacional se torna um verdadeiro espelho dos financiadores de campanha, ressaltou.
Aproximadamente 70% dos deputados federais eleitos ou 354 parlamentares, da atual legislatura foram financiados por apenas 10 empresas. Todos os graves escândalos que vimos se relacionam com o financiamento de campanhas eleitorais e temos as eleições mais caras da Terra, destacou Reis.
O MCCE vem persistindo neste assunto há muitos anos. Em 2008, com apoio da Associação dos Magistrados Brasileiros – AMB, uma pesquisa revelou que 34% dos brasileiros achavam o tema “Doação de Campanhas” um assunto “importante”. Em 2010, após a aprovação da Lei da Ficha Limpa, a sociedade começa a discutir o assunto mudando este índice para mais de 80%, demonstrando a notável importância que a população tem dado ao tema.
Márlon disse inda que a revogação das doações ocultas e que a obrigatoriedade dos relatórios sobre o financiamento gerados a cada 72 horas após cada doação (pessoa física) também são excelentes controles. “Assim, o Brasil vai acompanhar praticamente em tempo real, os valores arrecadados pelos candidatos. O que inibe a prática corrupta do caixa dois de campanha é a transparência e o controle”, ressaltou.
Finalizou dizendo que o MCCE nasceu para modificar a lei eleitoral e que o Movimento ainda tem muito a oferecer ao Brasil.
Participaram do evento representantes de várias entidades da Rede MCCE, estudantes, comitês MCCE, diplomatas, servidores públicos e representantes de entidades da sociedade civil.
O MCCE agradece imensamente aos que tornaram o evento possível:
Aos colaboradores
Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB e Embaixada dos Estados Unidos.
Aos apoiadores
Associação dos Magistrados Brasileiros – AMB,
Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais – APCF,
Conselho Federal de Enfermagem – CFF,
Instituto Avante Brasil,
Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil – Sindifisco Nacional.
O evento realizado faz parte dos trabalhos do MCCE pelas eleições municipais de 2016, foi transmitido ao vivo pelo canal do MCCE no YouTube. Assista aqui a íntegra do Colóquio!
Foto: Eugênio Novaes (OAB)
Ascom-MCCE
Fonte: Ascom-MCCE